O lado bom da bagunça
- Nathália Figueiredo
- 10 de jun. de 2020
- 6 min de leitura
Atualizado: 28 de fev. de 2022
Onde ficam os limites da organização dos pais na vida dos filhos?
Precisamos ser tão rígidos a ponto de impor nossos métodos de organização no espaço deles? Leia e descubra como uma dose certa de caos contribui para o desenvolvimento das crianças.

Quem nunca entrou no quarto dos filhos - ou na sala - e deu um pisão naquele boneco que estava no chão junto com outros milhares de peças de montar, e carrinhos, e panelinha, e massinha... Sem contar o guarda roupa revirado, e a criança já na terceira fantasia pega no sono e aquela cena digna de pesadelo sobra para você arrumar? Se isso já aconteceu, você provavelmente se agarra numa força de vontade, que precisa vir no fundo do peito, e começa a colocar "tudo em seu devido lugar".
Mas, será que é mesmo necessária uma intervenção tão brusca?
Vi uma vez, em uma conta do Instagram que eu sigo, uma mãe apresentando os brinquedos do filho. No início senti vergonha de mim mesma, porque os brinquedos estavam tão perfeitamente organizados em gavetas e caixas etiquetadas, onde os animais se dividiam em todas as classes, dos animais da selva aos répteis e anfíbios, e os meios de transporte em terrestre, aéreos e aquáticos, mas depois comecei a refletir, até onde isso seria saudável? Juro! O filho, ia completar dois anos e aparecia em metade dos stories com uma vassourinha e pá na mão, limpando arrumando e guardando, ou brincando "sem sujar". Ela alegava que o filho já nasceu organizado e metódico. Não quero criticar, apenas trazer para reflexão, porque se ele realmente nascera assim, não seria a missão dela ajudar o pequeno a relaxar? Para que exigimos tanta organização?
Tá certo que a organização trouxe e ainda gera imensos avanços na sociedade, mas na busca por catalogar e manter tudo sob controle, nós devemos tomar cuidado para não criar ambientes ultra limpos e perfeitamente organizados que acabam se tornando estéreis e não permitam o desenvolvimento de habilidades nas crianças, como o simples ato de encontrar soluções.
Bagunça criativa
Existem diversas pesquisas, que mostraram que bebes e crianças "bagunceiras" tem maior facilidade em aprender e encontrar soluções quando questionados. E isso se dá ao fato deles utilizarem o toque, a visão, o olfato para coletar informações sobre o ambiente. Ou seja, quando o seu filho bagunça tudo, a sua pequena mente criativa está a todo vapor se desenvolvendo e entendendo o mundo.
Os pais não precisam ser tão rígidos a ponto de impor seus métodos de organização no espaço dos filhos.
Por isso, antes de você brigar com o seu filho porque ele revirou tudo, tente olhar pelo prisma dele e avaliar o que ele está aprendendo naquele caos, converse, pergunte e vá aos poucos, explicando que, no final de tudo, ele precisara guardar as coisas para que no dia seguinte possa ter uma nova brincadeira diferente e ainda mais emocionante, mas de uma maneira equilibrada entre o que você acha que deve ser e o que ele deseja. Os pais não precisam ser tão rígidos a ponto de impor seus métodos de organização no espaço dos filhos.
Uso de telas x bagunça
Em um estudo com mil pais e crianças de 11 países, financiado por uma marca britânica de produtos de limpeza, mais da metade dos entrevistados adultos (57%) disseram que preferem ver o filho brincando com um Ipad do que com uma caixa de tintas para "não haver sujeira" e "por ser mais prático". Esse tipo de postura causa um efeito muito negativo nessa geração de crianças que já são cada vez mais bombardeadas com o uso de telas. Para as crianças, o ambiente ao seu redor é seu universo de descobertas, limitá-lo é também minimizar os desenvolvimentos dessas crianças. Além disso, crianças tem sido diagnosticadas erradamente com autismo por causa do uso excessivo de telas, por tamanho atraso no desenvolvimento que eles podem causar e que passa a ser resolvido após alguns meses sem essa exposição. Precisamos repensar isso e mudar essa realidade.
Ordem na casa
Tudo tem limite, mas a primeira coisa a fazer é observar se a criança está conseguindo se encontrar no próprio caos, observar se ela está conseguindo organizar os próprios brinquedos ou se vive perdendo com frequência suas coisas. Ai vale interferir, de modo que ela aprenda a interagir com os espaços e objetos de maneira saudável, sempre questionando seus métodos e seguindo sua linha de raciocínio.
Por exemplo, aqui em casa eu organizo os brinquedos em caixas e por "famílias", dinossauros com dinossauros, carrinhos com carrinhos, pistas... enfim. Só que, com frequência encontrava um dinossauro no meio das pistas e carrinhos. Aí eu tirava e guardava na outra caixa. Até que eu fui questionar o Joaquim e ele me respondeu que: "estava ocorrendo um ataque de dinossauro na cidade dos carros e que o dinossauro ficava ali pra ele não precisar pegar a outra caixa (com dinossauros) sempre". Minha lógica de organização não contava com o quesito "inventividade" do Joaquim.
...vale interferir, de modo que ela aprenda a interagir com os espaços e objetos de maneira saudável, sempre questionando seus métodos e seguindo sua linha de raciocínio.
Outra maneira de deixá-los desenvolver suas atividades é controlar o ambiente do caos. Aqui em casa, quando o Joaquim quer brincar de tinta, por exemplo, eu deixo ele fazer isso no box do banheiro, ele usa as paredes como tela, pode pintar o quanto quiser, se sujar, e a limpeza de tudo vem junto com o banho. Simples e me rende algumas horas de tranquilidade.
Mas eu deixo bagunçado, então?

Não, é possível dar liberdade aos seus filhos sem deixar que a casa se torne uma zona de guerra eterna. E ela precisa começar com você ensinando essa criança a estar no controle de seus espaços, respeitando a criatividade de individualidade de cada um. Além disso, ensiná-lo a respeitar os outros espaços e membros da casa. Aqui, nós nunca admitimos brinquedos espalhados pela casa, tampouco guardamos brinquedos na sala ou colocamos aqueles tapetas emborrachados colorido, nem tiramos objetos de decoração. Eles podem brincar em outros ambientes que não seja o quarto deles, mas sabem que ao terminar precisam levar tudo de volta, tudo é explicado na regra do respeito e do exemplo. As áreas em comum (sala, cozinha) é de todos. assim como eles não podem deixar brinquedos, nós pais, não deixamos objetos pessoais. Mas cada um pode decidir como irá abordar, afinal, isso vai depender da dinâmica de cada família.
Aqui vão cinco dicas para facilitar a vida na hora da organização:
Tenha lugar para tudo e faça de maneira acessível. Porta-livros, cabideiro, porta-trecos... faça uso de tudo isso para te auxiliar, mas faça de uma maneira que eles possam alcançar, senão "eu não alcanço" será a desculpa perfeita.
Aposte em caixas de brinquedo transparente e empilháveis para que seu filho veja o que tem dentro delas e que facilite na organização no armário. Abuse de todos os tamanhos.
Coloque etiquetas nas gavetas de roupa indicando o que tem dentro, se ele não souber, utilize desenhos e deixe-o dobrá-las mesmo que você tenha que vir ajeitando depois.
Incentive!! Mesmo que ele não esteja fazendo da maneira como você espera, elogie e mostre uma forma melhor, mas nunca diga que está errado, afinal, o erro é sob a perspectiva de quem?
Torne a hora de arrumação divertida. Aposte quem guarda mais rápido (ou em menos tempo com um cronometro), coloque uma música, sorria. Ele deve associar tudo isso a uma diversão e não a uma tarefa chata.
E, além de todas as dicas, procure identificar se seu filho tem um comportamento bagunceiro ou se é indisciplinado. Uma coisa é ele explorar o ambiente, outra é ter atitudes destrutivas, quebrando suas coisas e de outras pessoas, por exemplo. Por isso, a principal regra para um ambiente harmonioso, é entender que cada um tem uma maneira de lidar com o ambiente e a organização, mas é preciso ter o mínimo de ordem e respeito pelo próximo para não haver problemas em ambientes comunitário, seja a sala da casa, a escola ou o condomínio. Lembre-se que a maneira como ele se relaciona hoje será a maneira que ele se relacionará na vida adulta e o ponto de partida para isso é dentro da nossa casa.

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